sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

A triste geração que tudo idealiza e nada realiza

"Demorei sete anos (desde que saí da casa dos meus pais) para ler o saquinho do arroz que diz quanto tempo ele deve ficar na panela. Comi muito arroz duro fingindo estar “al dente”, muito arroz empapado dizendo que “foi de propósito”. Na minha panela esteve por todos esses anos a prova de que somos uma geração que compartilha sem ler, defende sem conhecer, idolatra sem porquê. Sou da geração que sabe o que fazer, mas erra por preguiça de ler o manual de instruções ou simplesmente não faz.

Sabemos como tornar o mundo mais justo, o planeta mais sustentável, as mulheres mais representativas, o corpo mais saudável. Fazemos cada vez menos política na vida (e mais no Facebook), lotamos a internet de selfies em academias e esquecemos de comentar que na última festa todos os nossos amigos tomaram bala para curtir mais a noite. Ao contrário do que defendemos compartilhando o post da cerveja artesanal do momento, bebemos mais e bebemos pior.

Entendemos que as BICICLETAS podem salvar o mundo da poluição e a nossa rotina do estresse. Mas vamos de carro ao trabalho porque sua, porque chove, porque sim. Vimos todos os vídeos que mostram que os fast-foods acabam com a nossa saúde – dizem até que tem minhoca na receita de uns. E mesmo assim lotamos as filas do drive-thru porque temos preguiça de ir até a esquina comprar pão. Somos a geração que tem preguiça até de tirar a margarina da geladeira.



Preferimos escrever no computador, mesmo com a letra que lembra a velha Olivetti, porque aqui é fácil de apagar. Somos uma geração que erra sem medo porque conta com a tecla apagar, com o botão excluir. Postar é tão fácil (e apagar também) que opinamos sobre tudo sem o peso de gastar papel, borracha, tinta ou credibilidade.

Somos aqueles que acham que empreender é simples, que todo mundo pode viver do que ama fazer. Acreditamos que o sucesso é fruto das ideias, não do suor. Somos craques em planejamento Canvas e medíocres em perder uma noite de sono trabalhando para realizar.

Acreditamos piamente na co-criação, no crowdfunding e no CouchSurfing. Sabemos que existe gente bem intencionada querendo nos ajudar a crescer no mundo todo, mas ignoramos os conselhos dos nossos pais, fechamos a janela do carro na cara do mendigo e nunca oferecemos o nosso sofá que compramos pela internet para os filhos dos nossos amigos pularem.

Nos dedicamos a escrever declarações de amor públicas para amigos no seu aniversário que nem lembraríamos não fosse o aviso da rede social. Não nos ligamos mais, não nos vemos mais, não nos abraçamos mais. Não conhecemos mais a casa um do outro, o colo um do outro, temos vergonha de chorar.

Somos a geração que se mostra feliz no Instagram e soma pageviews em sites sobre as frustrações e expectativas de não saber lidar com o tempo, de não ter certeza sobre nada. Somos aqueles que escondem os aplicativos de meditação numa pasta do celular porque o chefe quer mesmo é saber de produtividade.

Sou de uma geração cheia de ideais e de ideias que vai deixar para o mundo o plano perfeito de como ele deve funcionar. Mas não vai ter feito muita coisa porque estava com fome e não sabia como fazer arroz."

- Marina Melz

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Quando a saudade tem nome e sobrenome

"Eu, que jurei não te deixar porque te amava, vi você partindo e deixei você seguir em frente, porque eu te amava tanto a ponto de te ver feliz sem mim. Vi-me triste, mas o meu sorriso vem depois do teu. Vi-me em pedaços, mas você não precisa saber o que sobrou de mim pelo chão da casa, nem do que ficou de você espalhado por ela também. Você se foi, mas ainda tem tanta coisa sua por aqui.

Vou deixar que o tempo transforme tudo que é seu e meu, em qualquer coisa, menos nosso. Não que eu queira lhe esquecer de vez e ignorar tudo o que vivemos, sequer pensei em te esquecer. Mas é que a casa ficou cheia de saudade sua, não vou mentir. Eu estou ficando sem espaço, principalmente aqui no peito, a noite dá um aperto danado, é um incômodo para dormir. Todo dia fica mais apertado, por isso eu necessito de espaço.

Troquei o lençol que ainda continha o cheiro do teu perfume da última vez que você dormiu com a cabeça no meu travesseiro. E se eu durmo nele assim, com o teu cheiro, a minha cabeça fica em você. Atualizei a minha playlist com algumas músicas antigas, tem tanta música que eu ainda chamo de nossa. Vou apagá-las temporariamente, só até o tempo apagar o que é nosso. Prometo deixar guardada a primeira música que você me mostrou, vai ficar comigo, mas ela é sua. E se um dia você aparecesse do nada e me perguntasse sobre ela, eu a tiraria da gaveta de saudades e lhe daria, só pra você ver como eu guardei bem.



Limpar uma bagunça demora tanto, principalmente quando você tem preguiça de sair dela. O amor é assim, imprevisível. Ele entrou na minha casa e foi uma época feliz, mas quando saiu, deixou uma bagunça imensa e com algumas paredes do peito pintadas de saudade. Essa tinta não apaga nunca, você pode colocar outra coisa por cima, mas ela ainda vai estar lá no fundo, intacta.

Eu deixei você ir porque eu te amo e sei que você vai ser mais feliz sem mim. Não que eu não pudesse mais lhe amar e te fazer feliz, pelo contrário, você sabe o quanto eu a fiz feliz e como eu poderia continuar fazendo. O seu sorriso seguido de um choro na nossa despedida diz tudo. Foi um amor sincero, intenso e eterno. É um final triste de uma história feliz, de uma época feliz, de tantas outras coisas em que cabe a felicidade. Nosso amor foi daqueles Para Sempre, acabou, mas é para sempre.

Ninguém vai substituir o teu espaço aqui no peito, não. Às vezes ele anda apertado, mas também é gigante. Eu estou deixando as coisas no lugar, guardando algumas saudades na gaveta e tentando deixar a casa arrumada. Ninguém sabe quando o amor vem visitar de novo."

- Christian Vargas

Deixe ir quem não quer ficar

"Talvez um dos maiores entraves que nos emperrem o seguimento de nossa jornada venha a ser o medo de sofrer. Tememos enfrentar muitas dores, porque achamos que não conseguiremos suportá-las e, por essa razão, muitas vezes acabamos trazendo um sofrimento ainda maior para nossas vidas, mantendo conosco o que não nos ajuda a sermos felizes; muito pelo contrário.

Dentre os sofrimentos que evitamos, encontra-se o medo de nos separarmos do parceiro, que nem mais parceiro é, que nem mais nos ama, nos pede, nos chama para si. Protelamos, assim, um rompimento que já se tornou urgente e necessário, evitando tomar a atitude certa, a única atitude, aliás, possível e coerente naquele momento, uma vez que a manutenção desse alguém conosco está acabando com nossa vitalidade, com nossa razão de sorrir, com nosso potencial em amar com reciprocidade.

Por mais que o outro nos ignore, nos esqueça, nos torne invisíveis, muitas vezes acabamos tolerando além da conta, ainda que se extenuem nossas forças, mesmo que avisemos e avisemos de novo. Porque a gente acreditou tanto, a gente investiu tudo o que tinha, a gente se doou e se entregou de forma transparente e por inteiro, a gente quer dar certo no amor, ou seja, aceitar a falência daquilo que tomou tanto da gente dói demais.



E, assim, vamos mantendo em nossas vidas exatamente quem deveria ficar bem longe, quem já teve a chance de fazer parte de nós e não fez a menor questão de se doar, de compartilhar, de ser junto, quem nos vê somente como provedores de algum conforto, de alguma coisa de que ele precise, de tudo o que não implique troca e sentimento humano. E, assim, vamos aumentando nossa dose diária de dor e de sofrimento, exatamente porque pensamos estar evitando a dor da separação.

É preciso deixar ir. Deixe que vá quem fica por comodismo, quem fica como peso, como bagagem inútil, quem só recebe e nada devolve, quem não nos percebe, não nos enxerga, não nos espera pra nada, por nada. Mande embora de sua vida quem encostou feito gelo, quem suga, quem mente, quem pratica o tanto faz. O sofrimento por quem vai embora é dolorido, mas libertador. Prefira a dor do rompimento que aos poucos acalma a um sofrer diário por medo de sofrer. Dor sem fim ninguém merece, muito menos você."

- Marcel Camargo