quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Tudo vai ficar bem

"Eu não sei quem você é, mas sei que já ouviu isso antes. Eu não sei onde de você vem, mas sei que deve estar cansado. Eu não sei das suas batalhas, mas sei que, eventualmente, todo mundo sente o peso de suas bagagens lhe tombar as costas. Eu não sei o que você quer, mas sei que precisará de determinação e muito esforço pra conseguir.

Eu não sei a quem você decepcionou, mas sei que se estiver verdadeiramente arrependido merece perdão e que deve, primeiramente, vir de si mesmo. Eu não sei a quem você amou, mas sei que isso lhe acompanhará para o resto da sua vida, no entanto, isso não precisa definir o resto da sua vida. Eu não sei do que você tem medo, mas sei que para ter chegado até aqui foi preciso muita coragem, portanto, você vai conseguir superá-lo.



Eu não sei o que você já passou, mas sei que as boas pessoas que encontrou te marcaram tanto quanto as más. Eu não sei porque você chora, mas sei que vai sorrir quando tudo passar. Eu não sei quem você é, mas sei que, no fundo, assim como eu, você nasceu pra amar. E assim como eu, você já morreu de amor. Peço desculpas em nome de todas as pessoas que já te feriram, elas também estão aprendendo. Espero que você consiga entender que ninguém é digno do seu rancor, por isso nem você mesmo deve guardá-lo.

Eu não sei quem você é, mas sei que estamos no mesmo barco ou talvez no mesmo banco ou talvez na mesma rua. Eu não sei quem você é, mas tudo vai ficar bem porque qualquer ato de bondade por menor que seja faz a diferença no mundo, mesmo que você não veja."

- Autor desconhecido

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Desculpe-me pelo que a minha ansiedade me levou a fazer

"Quero que você saiba que não fui eu, foi minha ansiedade. Não sou eu, é um desequilíbrio químico em meu cérebro. Não é quem eu sou totalmente, é apenas uma parte de mim. A ansiedade me faz falar rapidamente, ou apenas não falar. Ela me faz ficar acordado até tarde, perambulando até as 3 da manhã, enquanto minha mente ainda corre uma maratona.

A ansiedade me faz ter olheiras tão escuras que nem o mais caro dos corretivos pode combatê-las. Ela faz meus olhos queimarem enquanto eu olho para o sol da manhã e tento me livrar da exaustão. Ela me deixa realmente cansado.

Me desculpe pelo que minha ansiedade me levou a fazer. Você precisa saber que esse não sou eu. Não é quem eu sou ou quem eu quero ser. É a ansiedade.


A ansiedade faz com que eu vá sem parar. Ela faz com que eu vá vá e vá até acabar meu gás. Ansiedade me faz recomeçar de novo, e de novo, e de novo. Ela me faz falar coisas que eu não deveria dizer. Ela faz com que eu espalhe segredos que não deveriam ser compartilhados. Ela me faz falar sobre a personalidade das outras pessoas pelas costas, apenas para que eu me sinta um pouco mais vivo. A ansiedade me transforma em alguém que eu não quero ser

A ansiedade me faz perder alguns amigos. Ela me deixa paranoico sobre ninguém me amar de verdade. Ela me faz cancelar encontros porque tenho medo. Ela faz minhas mãos tremerem por motivo algum. Ela me faz achar que estou ficando louco. A ansiedade me faz ficar em casa quando o tempo está lindo e ensolarado. Ela me faz não encontrar meus amigos ou parentes, mesmo que eu queria encontrá-los. Ela me faz tomar uma pílula toda manhã para combater os demônios na minha cabeça.

A ansiedade me faz pensar as piores coisas sobre mim mesmo.

A ansiedade me diz que não sou bom o bastante, que não sou forte o bastante. Ela me diz que sempre estarei sozinho e que sempre será assim. Ela me diz que meus amigos não são meus amigos de verdade e que ninguém nunca irá me amar. Me diz que nunca superarei meus antigos relacionamentos, não importa quanto tempo passe. A ansiedade faz com que eu me torne uma versão mais triste de mim. Ela faz com que eu gagueje e não possa beber muito café. Ela me deixa com medo do amor. Ela me faz cancelar meus planos.

A ansiedade faz com que eu me isole de todas as pessoas que amo.

Ela me deixa cansado, ela faz com que seja tão difícil respirar quando tudo que eu quero é respirar. A ansiedade faz com que eu esconda minhas mãos das pessoas para que elas não possam ver minhas unhas pintadas. Ela me faz odiar a todos e a tudo. Ela me faz pensar que não há sentido algum na luz do dia, que há muito mais escuridão no mundo do que eu possa imaginar. Então, me desculpe pelo que minha ansiedade me levou a fazer. Eu lamento pelo que minha ansiedade me diz.

Me desculpe por cancelar com você. Me desculpe pelas mensagens que mandei bêbado. Me desculpa por morder meus dedos até sangrarem. Me desculpe por tentar respirar. Me desculpe por cuspir as palavras ao invés de deixar que meu cérebro acompanhe meus pensamentos.

Me desculpe por pensar demais, me desculpe por não conseguir mudar isso. Me desculpe pelo meu cérebro. Me desculpe, mas você tem que lidar com isso. Espero que você entenda: a culpa é da ansiedade, não minha."

- Lauren Jarvis-Gibson

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Primeiro fique sozinho

"Primeiro fique sozinho. Primeiro comece a se divertir sozinho. Primeiro amar a si mesmo.

Primeiro ser tão autenticamente feliz, que se ninguém vem, não importa; você está cheio, transbordando.

Se ninguém bate à sua porta, está tudo bem, você não está em falta. Você não está esperando por alguém para vir e bater à porta. Você está em casa.

Se alguém vier, bom, belo. Se ninguém vier, também é bom e belo

Em seguida, você pode passar para um relacionamento.



Agora você se move como um mestre, não como um mendigo.Agora você se move como um imperador, não como um mendigo. E a pessoa que viveu em sua solidão será sempre atraído para outra pessoa que também está vivendo sua solidão lindamente porque o mesmo atrai o mesmo.

Quando dois mestres se encontram – mestres do seu ser, de sua solidão – felicidade não é apenas acrescentada: é multiplicada. Torna-se uma tremendo fenômeno de celebração. E eles não exploram um ao outro, eles compartilham.

Eles não utilizam o outro.

Em vez disso, pelo contrário, ambos tornam-se UM e desfrutam da existência que os rodeia."

- Osho

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Pode me chamar de gay

"Pode me chamar de gay, não está me ofendendo. Pode me chamar de gay, é um elogio. Pode me chamar de gay, apesar de ser heterossexual, não me importo de ser confundido. Ser gay me favorece, me amplia, me liberta dos condicionamentos. Não é um julgamento, é uma referência. Pode me chamar de gay, não me sinto desaforado, não me sinto incomodado, não me sinto diminuído, não me sinto constrangido. 

Pode me chamar de gay, está dizendo que sou inteligente. Está dizendo que converso com ênfase. Está dizendo que sou sensível. Pode me chamar de gay. Está dizendo que me preocupo com os detalhes. Está dizendo que dou água para as samambaias. Está dizendo que me preocupo com a vaidade. Está dizendo que me preocupo com a verdade. Pode me chamar de gay. Está dizendo que guardo segredo. Está dizendo que me importo com as palavras que não foram ditas. Está dizendo que tenho senso de humor. Está dizendo que sou carente pelo futuro. Está dizendo que sei escolher as roupas.



Pode me chamar de gay. Está dizendo que cuido do corpo, afino as cordas dos traços. Está dizendo que falo sobre sexo sem vergonha. Está dizendo que danço levantando os braços. Pode me chamar de gay. Está dizendo que choro sem o consolo dos lenços. Está dizendo que meus pesadelos passaram na infância. Está dizendo que dobro toalha de mesa como se fosse um pijama de seda. 

Pode me chamar de gay. Está dizendo que sou aberto e me livrei dos preconceitos. Está dizendo que posso andar de mãos dadas com os anéis. Está dizendo que assisto a um filme para me organizar no escuro. Pode me chamar de gay. Está dizendo que reinventei minha sexualidade, reinventei meus princípios, reinventei meu rosto de noite. Pode me chamar de gay. Está dizendo que não morri no ventre, na cor da íris, no castanho dos cílios. Pode me chamar de gay. Está dizendo que sou o melhor amigo da mulher, que aceno ao máximo no aeroporto, que chamo o táxi com grito. 

Pode me chamar de gay. Está dizendo que me importo com o sofrimento do outro, com a rejeição, com o medo do isolamento. Está dizendo que não tolero a omissão, a inveja, o rancor. Pode me chamar de gay. Está dizendo que vou esperar sua primeira garfada antes de comer. Está dizendo que não palito os dentes. Está dizendo que desabafo os sentimentos diante de um copo de vinho. Pode me chamar de gay. Está dizendo que sou generoso com as perdas, que não economizo elogios, que coleciono sapatos. 

Pode me chamar de gay. Está dizendo que sou educado, que sou espontâneo, que estou vivo para não me reprimir na hora de escrever. Pode me chamar de gay. Que seja bem alto. 

A fragilidade do vidro nasce da força e do ímpeto do fogo."

- Fabrício Capinejar

quarta-feira, 14 de junho de 2017

Tente se acalmar

"A sua cabeça é um liquidificador. Mistura todas as suas vontades em um mesmo lugar sem saber onde tudo vai dar. Você quer muita coisa e todas elas para ontem. Você tem pressa. É que você já passou por cada momento na vida que não vê a hora de tudo começar a dar certo como deseja. Só que você não consegue focar muito. É tanto querer que você se perde nas prioridades. Tente se acalmar, mas não se acomode.

Tente se acalmar para conseguir tirar a cabeça para fora dessa turbilhão em que se vê dentro. Não dá para ter tudo de uma vez na vida. Não para dedicar a mesma força em tudo e em tudo o que gente quer. A saída é encontrar um foco, é encontrar um norte e se concentrar. Até que provem o contrário, nunca fará mal acreditar que a conquista de uma coisa boa vai atrair as outras, mas para isso é preciso conquistar a primeira antes.



Tente se acalmar. É que talvez você esteja querendo tudo, a qualquer custo, desde que seja agora pois amanhã você vai… Bem, amanhã você não vai nada. Amanhã vai ser só mais um dia mais perto de novas contas para pagar. É que você tem tanta pressa para o bolo ficar pronto que não consegue sentir o cheiro dos ingredientes. Entende?

Você quer tanto o que tanto deseja que não consegue ver graça no que já tem ou no que acaba conquistando, sabe? Tente se acalmar e tente ver vitórias nas pequenas coisas do dia a dia. É que com certeza isso te aliviará um peso nas costas por ver que as coisas nem vão tão mal assim como imaginava. Tente se acalmar. Tente respirar um pouco em silêncio.Vai ficar tudo bem, mas não vai ser tudo agora. Muito difícil ser tudo agora. Vai ser aos poucos, vai ser quando for a hora.

Você tem atropelado o calendário querendo tanto que chegue a sexta-feira sem dar a mínima para a segunda, terça, quarta e quinta. Percebe? Tente se acalmar e tente praticar a paciência para o seu dia acontecer. É que isso, automaticamente, faz a vida engrenar. Funciona assim: quanto mais a gente conseguir valorizar as pequenas alegrias do nosso dia, mais a gente vai aproveitar as grandes felicidades. E mais rápido elas vão acontecer. Tente se acalmar. Vai dar tudo certo!

Vai chegar o emprego que você gosta, vai receber o salário que acha justo, vai conhecer alguém que te faça bem, vai conseguir pagar as faturas, vai conseguir orgulhar sua família, vai criar a sua própria, vai viajar para onde sonha, vai acontecer tudo e muito mais, mas antes você vai ter que continuar em pé em todas as voltas que o mundo dá. Aguenta firme, aguenta que vai funcionar. Sua cabeça é um liquidificador, eu sei, mas tente se acalmar."

- Rafael Magalhães

quarta-feira, 24 de maio de 2017

Eu não quero casar com você

"Você conhece alguém. Sai com ele uma ou duas vezes. Gosta do papo do gajo, do beijo do gajo, dos olhos do gajo. Convida-o para um segundo ou terceiro encontro. Nada mais natural, afinal de contas, você gostou dele. Ele gela, some, desaparece da face da Terra. Provavelmente acredita piamente que você está apaixonada por ele como nunca esteve por pessoa nenhuma. E isso é uma das coisas mais irritantes que acontecem durante nossa constante tentativa de conhecer alguém: o fato de que as pessoas pressupõem que você está sempre atrás de compromisso.


Quando você convida alguém pra sair com interesses românticos na pessoa, nada é garantido. Vocês podem sair de lá como melhores amigos, podem se odiar, podem querer apenas sexo, podem amar o outro a ponto de marcar uma viagem de casal pra próxima semana. Mas isso é determinado durante os encontros, durante a construção de alguma coisa entre os dois.

Essa construção nem sempre designa um relacionamento sério. Conheço casais que estão há tempos nessa de conhecer o outro. Eles saem juntos, transam, assistem a filmes na casa do outro, comem pizza com os amigos e ambos são felizes. Isso só aconteceu porque um deles – ou os dois – quebraram a barreira do “quero te ver” que todo mundo tem medo de dizer depois de um encontro bem sucedido.

Nós criamos uma utopia tão grande e tão congelada em torno do que é se relacionar que acabamos acreditando que todo relacionamento tem que seguir um molde fixo de encontros-namoro-casamento e seja lá o que vier depois disso. Não é assim, gente. Não se aprova status sem que haja demanda pra isso. Nessa vida você vai conhecer pessoas maravilhosas com quem o sexo era incrível e só isso. Você vai conhecer pessoas incríveis com quem você passaria anos sem trocar beijos, porque amizade também nasce de encontros. Você vai encontrar gente que só depois de 5 ou 6 meses é que vai se apaixonar por ti, ou nem vai.

Descartar encontros agradáveis por medo, ou melhor, por pressupor que a outra parte esteja loucamente apaixonada por você é burrice. Na maioria das vezes, a pessoa só gostou de você e quer te conhecer melhor, sem pretensão alguma de te pedir em casamento. Mas ao invés de seguirem o fluxo das coisas e deixarem tudo acontecer naturalmente, muita gente coloca barreiras. Cismam que você já planeja casar e ter filhos, cismam que você é algum tipo de pessoa louca e psicopata que quer trancá-los em celas minúsculas em porões inexistentes. Será que as pessoas não percebem que o caminho natural de todo e qualquer relacionamento é a sucessão de encontros? Caso não percebam, sugiro que mudem seus perfis de conversa e parem de dizer que estão querendo “conhecer alguém”. Porque é exatamente isso que estão se negando a fazer."

- Daniel Bovolento

segunda-feira, 8 de maio de 2017

Feliz dois anos de namoro!

"Hoje, 3 de maio, eu e Camila comemoramos dois anos de namoro e desde o início do ano programávamos algo para comemorar esta data. Porém, as coisas nem sempre saem como o esperado e nos vemos tendo que mudar tudo que fora planejado. 

Há dezessete dias, caímos juntos de moto. Nada grave, nem comigo, nem com Camila, que sofreu apenas pequenos arranhões - nem com a moto. A única coisa que sofri foi uma lesão interna na coxa e por isso tive que ficar sendo acompanhado para ver a evolução da lesão. Então, há oito dias, o hematoma, sem melhora, crescia rapidamente, e por isso o ortopedista que me acompanha resolveu realizar um pequeno procedimento cirúrgico para drenar o líquido que acumulava. Tudo ocorreu bem e estou me recuperando muito bem. Não se preocupem.

Mas esse papo aqui não é sobre mim. É sobre ela: minha amiga, minha namorada, minha companheira de todas as horas.

Desde que fui internado, tudo que eu já recebia de Camila foi dobrado: o cuidado, a atenção, o carinho, as ligações, as mensagens. Tudo. São dois estágios: um de manhã e outro à tarde; e a faculdade à noite. Mesmo assim, e mesmo eu dizendo que não precisava vir, ela sempre fez questão de vir me acompanhar a noite, mesmo tendo que dormir em um sofá que mal lhe cabe. 

E é por isso que hoje não terá foto de restaurante, hotel, presentes, sorrisos e beijos. Hoje terá foto de um momento em que as coisas não vão bem e é exigido do outro o sacrifício, a "prova" de tudo que é dito no curso de um relacionamento. 

Hoje terá foto de quando o amor está presente mesmo quando não há perfume, não há maquiagem, não há roupinha arrumada, cabelo lavado e três banhos por dia. Hoje terá foto da prova real do "na saúde e na doença" sem que seja necessário proferir uma palavra. Hoje terá foto que transcende a estética e escancara o maior e mais puro sentimentos de todos: o amor.



Como vocês costumam dizer aqui: nada a pedir, só agradecer."

- Gustavo de Freitas

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Eu não me descobri gay, me avisaram

"Me avisaram ainda quando pequeno, quando cursava as séries iniciais na escola. Me avisaram que eu andava demais com as meninas e um dia poderia ser confundido com uma delas. Estranhavam o fato de eu ir muito bem nas aulas, ter uma letra bonita e a professora sempre me pedir pra passar a lição no quadro. Afinal, gostar de estudar e tirar boas notas eram coisas de menina. "Esse menino é muito delicado", avisavam uns aos outros.

Um pouco mais velho, por volta dos 10, meu cabelo caía nos ombros e era grande o suficiente pra me confundirem, de fato, com uma garota. Minha mãe odiava: o meu cabelo comprido, claro, e não só as confusões que faziam. Ela me obrigava a corta-lo e eu, sempre firme, nunca aceitava. "Corta esse cabelo, parece uma menina! Todo mundo na rua comenta", era mais uma vez avisado.

Eu pensava: e qual o problema se eu realmente parecer uma menina? Uma vez minha mãe me levou ao cabeleireiro e, sem me deixar saber, pediu pro moço cortar bem curto. Eu passei meses sem sair de casa. Quando ia pro colégio, usava capuz pra esconder o cabelo curto e por vergonha - acho que de parecer um menino.

Minha voz fina era característica certeira para me avisarem "vai ser gay". O verbo no futuro dava a entender que eu era hétero e um dia, como num passe de mágica, me "transformaria" em gay. Eu não sabia o que era ser gay, não conhecia minha sexualidade e nem compreendia sua complexidade. E mesmo assim todos me consideravam gay. No ensino fundamental não tinha jeito: onde eu ia, ouvia gritos "viadinho", "bichona", "vira homem". Eu sempre me ofendia porque ninguém nunca havia me dito que tudo bem ser gay e por isto, eu não sabia me defender. O que ia responder? "Não sou uma bichona. Sou macho, sou hétero, olha meu cabelo comprido como de uma menina, minha voz fina como de uma menina, meu jeito de andar, de falar, sou delicado, como uma menina. Não está vendo? Não sou viado". Era impossível evitar os avisos. "Avisos", neste caso, também podem ser entendidos como ofensas. Ou eu apenas vivia e ignorava todos os avisos, ou tinha que imitar um macho-alfa o tempo todo - o que nenhum ser humano merece.

Quando levei minha mãe pra fazer minha inscrição do balé, aos 12, ela perguntou se eu tinha certeza que queria dançar. "Você pode continuar só no xadrez aos sábados, rafa", me avisou. Eu conheci a dança na igreja que frequentava quando pequeno. As meninas dançavam e eu achava lindo. Um dia pedi pra participar e levaram o caso até o pastor que recusou de imediato por temer a reação das pessoas. Tive que me contentar em fazer parte do grupo de hip hop.

Na oitava série, cansado de tantos avisos, tive uma namoradinha numa tentativa frustada de provar pros outros e pra mim mesmo que estavam errados quanto a minha sexualidade. Ela logo percebeu que minha presença não era muito efetiva e arrumou um namorado que, desta vez, parecia se sentir atraído por meninas.

Se ensino médio tivesse outro nome se chamaria: libertação. Quando deixei o ensino fundamental e passei a estudar longe de casa com pessoas totalmente desconhecidas, me encontrei. Fiz amigos que gostavam das mesmas coisas que eu e lá, ninguém me chamava de viadinho pelos corredores.

Com o tempo fui mudando meu jeito de me vestir e de me portar. Fui me aceitando como era naturalmente, desde criança, parecido com uma menina. Cortava minhas roupas, usava shorts curto e queria "estar na moda". Uma vez o diretor do colégio chamou eu e uma amiga pra conversar e questionou o uniforme cortado. "Vocês não podem se vestir assim aqui dentro", ele avisou. "É o nosso estilo. O nome da escola está aqui. Não vamos mudar". Minha mãe diz que passei a ficar rebelde. Rebelde, neste caso, pode ser entendido como ir contra todas as regras morais de casa e da sociedade.

Aos 15, ainda no ensino médio, saí pra uma festa com uns amigos e fiquei, de fato, com um garoto - que foi namorado por dois anos. Estava num lugar em que todos eram como eu e ninguém me julgava por estar beijando um garoto. Foi o marco pra minha aceitação. "É isso que eu sou! Essa é minha vida. Cansei de todos os avisos".

E depois de tantos avisos que tive ouvir durante toda a vida, quando finalmente me assumi e decidi viver todas as características que me apontavam desde pequeno, vi todos se assustarem. Realmente não é tarefa fácil ser você mesmo. Eu não me descobri gay, me avisaram. E eu decidi viver todos os avisos."

- Rafael Rodrigues

terça-feira, 7 de março de 2017

Eu não tenho mais paciência para relacionamentos (fúteis)

"Depois de 20 e tantos anos de vivência e uns poucos anos de interações com seres humanos em relacionamentos, cheguei à conclusão de que prefiro cachorros. Não, não é nenhum caso de zoofilia ou alguma intenção afetiva de manter relações com animais domésticos, calma lá. É só a constatação de que pessoas podem ser exaustivas em certos pontos da vida.

“Não sei se quero”, “não sei se posso”, “não sei se hoje dá”, “gosto de você e também gosto dele”, “é que tem meu ex na jogada”, “você se importa de não contar pra ninguém da gente”, “eu vou te apresentar como meu amigo”, “eu não sei o que eu sinto por você”, “vamos continuar levando e ver onde dá”, “ele é só um amigo que eu pego de vez em quando”, “não sei se tô preparado pra um relacionamento sério, sabe?” e por aí vai. São tantas e tantas frases que desgastam durante as fases de conquista e começo de relacionamento que dificilmente se engrena em algo. Além das pessoas interessantes, a busca também é por pessoas descomplicadas e coerentes.

Veja bem, hoje em dia a gente trabalha, estuda, faz o corre pra pagar as contas, tem que manter a vida mais saudável, marca médicos sem a ajuda dos pais, tem que dar conta da casa, tem que cozinhar, tem que fazer um monte de coisas em prol do próprio bem estar. Inserir outra pessoa no meio dessa vida mais complexa não é tão fácil quanto era na época da faculdade ou do colégio. Não é só gostar de alguém e pronto. Tem muita coisa em jogo, inclusive a paciência. Você já se sentiu cansado a ponto de não querer entrar em relações por um tempo? Pois é, acontece.


Cheguei naquela fase em que relacionamentos são desgastantes. Pessoas são complicadas e, na maioria das vezes, deveriam procurar ajuda terapêutica para resolver traumas e questões que não deveriam envolver terceiros. Relacionar-se é um ato não só de coragem e de abertura emocional, mas um exercício de paciência. Dispor-se a entender o outro é um investimento de tempo que poderia ser empregado em outros setores da nossa vida que precisam de atenção. Pessoas enroladas e que não nos dão a mínima visão de futuro só servem para gastar energia.

Não consigo mais marcar encontros ou passar mais de três meses com alguém que não vai pra frente. Gente que só dá desculpas, que é confusa demais, que ainda sente algo pelo ex. Gente que nunca pode nada, que adora manter os "contatinhos" ali do lado, que não tem a menor ideia do que tá sentindo por mim. Gente que não trepa e nem sai de cima, que não dá um passo à frente, que não vai passar de um daqueles rolos enrolados que a gente não sabe explicar direito pros amigos o que foi que aconteceu.

Não consigo mais dispensar energia que não seja pra dentro de mim. Quero dar carinho pra mim, me levar pra passear, ver os filmes do Oscar sozinho, escolher um puta restaurante legal pra jantar, comprar passagens aéreas, economizar dinheiro para ir fazer um mochilão, decorar minha casa nova, comprar uma bike pra ir dar voltas ao parque, passar uma manhã inteira na cama lendo algo sem precisar sair dela, fazer tudo o que eu já fazia antes comigo mesmo, mas sem dar brecha pra alguém interferir nisso. Repare só: não é nada de extraordinário, nada que a gente já não faça, nada que não exista numa relação em que o amor-próprio já impere. Essa é só uma fase de autopreservação e de identificação de prioridades. Gato, cachorro, periquito, papagaio ou um amor-furado: nenhum deles tem lugar na minha vida se a companhia não fizer bem e servir só pra gastar o tempo que eu poderia estar gastando cuidando de mim."

- Daniel Bovolento

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

A triste geração que tudo idealiza e nada realiza

"Demorei sete anos (desde que saí da casa dos meus pais) para ler o saquinho do arroz que diz quanto tempo ele deve ficar na panela. Comi muito arroz duro fingindo estar “al dente”, muito arroz empapado dizendo que “foi de propósito”. Na minha panela esteve por todos esses anos a prova de que somos uma geração que compartilha sem ler, defende sem conhecer, idolatra sem porquê. Sou da geração que sabe o que fazer, mas erra por preguiça de ler o manual de instruções ou simplesmente não faz.

Sabemos como tornar o mundo mais justo, o planeta mais sustentável, as mulheres mais representativas, o corpo mais saudável. Fazemos cada vez menos política na vida (e mais no Facebook), lotamos a internet de selfies em academias e esquecemos de comentar que na última festa todos os nossos amigos tomaram bala para curtir mais a noite. Ao contrário do que defendemos compartilhando o post da cerveja artesanal do momento, bebemos mais e bebemos pior.

Entendemos que as BICICLETAS podem salvar o mundo da poluição e a nossa rotina do estresse. Mas vamos de carro ao trabalho porque sua, porque chove, porque sim. Vimos todos os vídeos que mostram que os fast-foods acabam com a nossa saúde – dizem até que tem minhoca na receita de uns. E mesmo assim lotamos as filas do drive-thru porque temos preguiça de ir até a esquina comprar pão. Somos a geração que tem preguiça até de tirar a margarina da geladeira.



Preferimos escrever no computador, mesmo com a letra que lembra a velha Olivetti, porque aqui é fácil de apagar. Somos uma geração que erra sem medo porque conta com a tecla apagar, com o botão excluir. Postar é tão fácil (e apagar também) que opinamos sobre tudo sem o peso de gastar papel, borracha, tinta ou credibilidade.

Somos aqueles que acham que empreender é simples, que todo mundo pode viver do que ama fazer. Acreditamos que o sucesso é fruto das ideias, não do suor. Somos craques em planejamento Canvas e medíocres em perder uma noite de sono trabalhando para realizar.

Acreditamos piamente na co-criação, no crowdfunding e no CouchSurfing. Sabemos que existe gente bem intencionada querendo nos ajudar a crescer no mundo todo, mas ignoramos os conselhos dos nossos pais, fechamos a janela do carro na cara do mendigo e nunca oferecemos o nosso sofá que compramos pela internet para os filhos dos nossos amigos pularem.

Nos dedicamos a escrever declarações de amor públicas para amigos no seu aniversário que nem lembraríamos não fosse o aviso da rede social. Não nos ligamos mais, não nos vemos mais, não nos abraçamos mais. Não conhecemos mais a casa um do outro, o colo um do outro, temos vergonha de chorar.

Somos a geração que se mostra feliz no Instagram e soma pageviews em sites sobre as frustrações e expectativas de não saber lidar com o tempo, de não ter certeza sobre nada. Somos aqueles que escondem os aplicativos de meditação numa pasta do celular porque o chefe quer mesmo é saber de produtividade.

Sou de uma geração cheia de ideais e de ideias que vai deixar para o mundo o plano perfeito de como ele deve funcionar. Mas não vai ter feito muita coisa porque estava com fome e não sabia como fazer arroz."

- Marina Melz